Tribulações

TRIBULAÇÕES

 Não
é fácil enfrentar provações e dificuldades com um sentimento de alegria. É mais
natural sentirmo-nos contrariados, amargos e ressentidos até contra Deus, por
permitir que tais provações perturbem nossas vidas. Entretanto, São Tiago sabe
que Deus deixa que essas coisas aconteçam para que nossa fé possa ser
construída e se torne firme, confiável. Tal como o amor que Deus tem por nós.
Descobrir que o amor está envolvido na adversidade é uma das maiores
necessidades humanas. O profeta Habacuque demonstra a sua fé em face de grande
adversidade afirmando:

 “Ainda que a figueira não floresça, nem
haja frutos nas vinhas, que falhe a produção de azeitonas e os campos não deem
colheita, que o rebanho se extravie e não haja animais na estrebaria, mesmo
assim eu me rejubilo no Senhor. Terei alegria em Deus, meu Salvador, em Deus o
Senhor, que é minha força; ele faz com que meus pés possam andar em lugares
escarpados
” (Hb 3,17-19).

Deus
é 
nosso Pai, não importa quão difíceis as coisas
são para nós.

Jesus é nosso Salvador,
por mais desesperadas que sejam as situações.

 O
Espírito Santo enche 
nossas vidas e jamais poderemos ser separados
da presença de Deus dentro de nós, mesmo nos momentos mais terríveis.

 

Como
filhos da nova aliança de Deus, ele é nosso Pai, Salvador, Conselheiro e
Senhor.

 O
amor firme do Senhor nunca nos falha, suas misericórdias jamais têm fim; são
novas todas as manhãs; imensas em sua fidelidade. ‘O Senhor é a minha porção’,
diz minh’alma, ‘portanto esperarei nele. Deus é bom para aqueles que nele
esperam, para a alma que o busca’
” (Lm 3,22-25).

 




Você
já leu o livro de Jó? No início do livro, no capítulo 1, v. 8, lemos que ele
“era um homem íntegro e reto, que temia a Deus e se mantinha longe do mal.” No
versículo 12 lemos que Satanás teve permissão de Deus para provar a fé de Jó.
E, de fato, atormentou sua vida. Fê-lo perder seu gado, seus carneiros, seus
camelos, seus servos e até seus filhos. Entretanto, “no meio de tudo”, diz o
versículo 22, “Jó não pecou nem acusou por isto.”



Depois, Jó foi acometido de intensos sofrimentos físicos, mas ainda assim
(2,10), “não pecou através de seus lábios”. Três amigos vieram para consolá-lo.
Sentaram-se com ele, viram como era grande seu sofrimento, e depois passaram a
dar-lhe capítulo após capítulo de conselhos.

 

O
servo de Deus estava enfrentando três oponentes:

  – Estava sofrendo pelo que Satanás lhe havia feito a ele, às suas posses
e às pessoas que amava.

   – Sofria pelas críticas dos seus amigos, que lhe disseram que ele devia ser
culpado de tudo aquilo que lhe acontecera.

   – Sofria pelos seus próprios temores: “Aquilo que temo me acontece”, dizia ele.
Ele esperava dificuldades, e as teve.

Deus não nos promete uma vida livre de aflições e de provações; mas em Jesus
ele nos deu a vitória sobre todas as obras de Satanás. O Senhor e nosso Deus
não desamparará jamais o homem que pôs nele a sua confiança.

 Por Dom Cipriano Chagas

 

Quem é Deus?

Quem é Deus?

A natureza de
Deus e Seu agir

Ao longo da história, todas as culturas
se fizeram esta pergunta; tanto é assim que os primeiros sinais de civilização
se encontram, geralmente, no âmbito religioso e cultural. Crer em Deus está em
primeiro lugar para o homem de qualquer época. 


A diferença essencial está em qual Deus se crê. De fato,
em algumas religiões pagãs o homem adorava as forças da natureza, enquanto
manifestações concretas do sagrado, e contavam com uma pluralidade de deuses,
ordenada hierarquicamente. Na Grécia Antiga, por exemplo, também a divindade
suprema, em um panteão de deuses, era regida, por sua vez, por uma necessidade
absoluta que abarcava o mundo e os próprios deuses. 

Para muitos estudiosos da história das religiões, em muitos povos ocorreu uma
progressiva perda a partir de uma “revelação originária” do único Deus. Mas, em
todo caso, inclusive nos cultos mais degradados, podem ser encontradas chispas
ou indícios em seus costumes da verdadeira religiosidade: a adoração, o sacrifício,
o sacerdócio, o oferecimento, a oração, a ação de graças, etc.

A razão, tanto na Grécia como em outros lugares, tratou de purificar a
religião, mostrando que a divindade suprema devia identificar-se com o bem, a
beleza e o próprio ser, enquanto fonte de todo bem, de todo o belo e de tudo o
que existe. Mas isto sugere outros problemas, concretamente o afastamento de
Deus por parte do fiel, pois desse modo a divindade suprema ficava isolada em
uma perfeita autarquia, já que a mesma possibilidade de estabelecer relações
com a divindade era vista como um sinal de fraqueza. Além disso, tampouco fica
solucionada a presença do mal
, que aparece de algum modo como
necessária, pois o princípio supremo está unido por uma cadeia de seres
intermediários, sem solução de continuidade, ao mundo.


A revelação judaico-cristã mudou radicalmente este quadro: Deus é representado,
na Escritura, como Criador de tudo o que existe e Origem de toda força natural.
A existência divina precede absolutamente a existência do mundo, que é
radicalmente dependente do Senhor. Aqui está contida a ideia de transcendência:
entre Deus e o mundo a distância é infinita e não existe uma conexão necessária
entre eles. O homem e todo o criado poderiam não ser, e naquilo que são
dependem sempre de outro; ao passo que Deus é, e o é por si mesmo. 

Esta distância
infinita, esta absoluta pequenez do homem diante de Deus, mostra que tudo o que
existe é querido por Ele com toda Sua vontade e liberdade: tudo o que existe é
bom e fruto do amor (cfr. Gn 1). O poder de Deus não é limitado nem no espaço nem no tempo, por isso
Sua ação criadora é dom absoluto, é amor. Seu poder é tão grande que quer
manter Sua relação com as criaturas; inclusive salvá-las se, por causa de sua
liberdade, afastarem-se do Criador. Portanto, a origem do mal deve ser situada
em relação com o eventual uso equivocado da liberdade por parte do homem – coisa
que, de fato, ocorreu, como narra o Gênesis: vid. Gn 3 -, e não com algo
intrínseco à matéria.

Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer que, em razão do que se acaba de
mencionar, Deus é pessoa que atua com liberdade e amor. As religiões e a filosofia se
perguntavam “o que é Deus”; mas, pela revelação, o homem é levado a
se perguntar “quem é Deus” (cfr. Compêndio, 37); um Deus que sai ao
seu encontro e busca o homem para falar-lhe como a um amigo (cfr. Ex 33,11).
Tanto é assim que o Senhor revela a Moisés o Seu nome, “Eu sou aquele que sou”
(Ex 3,14), como prova de Sua fidelidade à aliança e de que o acompanhará no
deserto, símbolo das tentações da vida. 


É um nome misterioso que, em todo caso, nos dá a conhecer as riquezas contidas
em Seu mistério inefável: somente Ele é, desde sempre e para sempre, aquele que
transcende o mundo e a história, mas que também se preocupa com o mundo e
conduz a história. Ele foi quem fez o céu e a terra, e os conserva. Ele é o
Deus fiel e providente, sempre junto a Seu povo para salvá-lo. Ele é o Santo
por excelência, “rico em misericórdia” (Ef 2, 4), sempre disposto ao perdão.
Deus é o ser espiritual, transcendente, onipotente, eterno, pessoal e perfeito.
Ele é a verdade e o amor” (Compêndio, 40).


Assim, pois, a revelação se apresenta como
uma novidade absoluta, um dom que o homem recebe do alto e que deve aceitar com
reconhecimento de ação de graças e um obsequio religioso. Portanto a revelação
não pode ser reduzida a meras expectativas humanas, vai muito mais além: ante a
Palavra de Deus que se revela só cabe a adoração e o agradecimento, o homem cai
de joelhos ante o assombro de um Deus, que, sendo transcendente, se faz
interior intimo meo (Santo Agostinho, Confissões, 3, 6, 11), mais próximo de
mim que eu mesmo e que busca o homem em todas as situações de sua existência:
“O criador do céu e da terra, o único Deus que é fonte de todo ser, este único Logos criador, esta Razão criadora ama
pessoalmente ao homem, mais ainda, ama-o apaixonadamente e quer, por sua vez,
ser amado. Por isso, esta Razão criadora, que ao mesmo tempo ama, dá vida a uma
história de amor (…), amor que se manifesta cheio de inesgotável fidelidade e
misericórdia; é um amor que perdoa além de todo e qualquer limite” (Bento XVI,
Discurso na IV Assembléia Eclesial Nacional Italiana, 19-10-2006.

Giulio Maspero
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Aprender a ser fiel

Aprender a ser fiel

Nossa Senhora
manteve o seu sim e convida-nos a ser leais

A fidelidade a uma pessoa, a um
amor, a uma vocação, é um caminho em que se alternam momentos de felicidade e
períodos de escuridão e dúvida. Nossa Senhora manteve o seu sim e convida-nos a
ser leais, vendo a mão de Deus também naquilo que não compreendemos.


Decorreram quarenta dias após o nascimento de Jesus, e a Sagrada Família põe-se
a caminho para cumprir o que está mandado pela Lei de Moisés: todo varão
primogênito será consagrado ao Senhor (Lc 2, 23). A distância de Belém a
Jerusalém não é muita, mas são necessárias várias horas para percorrê-la a
cavalo; uma vez na capital judaica, Maria e José dirigem-se ao Templo. Antes de
entrar, cumpririam com toda piedade os ritos de purificação; também comprariam,
em uma tenda próxima, a oferta prescrita aos pobres: um par de rolas ou duas
pombinhas. A seguir, através das portas de Hulda e dos monumentais corredores
subterrâneos por onde transitavam os peregrinos, chegariam à grande explanada.
Não é difícil imaginar a sua emoção e recolhimento enquanto se encaminhavam
para o átrio das mulheres.
 
Talvez neste momento teria se aproximado um homem idoso. Em seu rosto
reflete-se a satisfação. Simeão saúda com afeto a Maria e a José, e manifesta a
ansiedade com que esperava esse momento. É consciente de que seus dias estão
chegando ao fim, mas sabe também – o Espírito Santo revelou-lhe (Lc 2, 26) –
que não morreria sem ver o Redentor do mundo. Ao vê-los entrar, Deus fez-lhe
reconhecer, nesse Menino, o Santo de Deus. Com o lógico cuidado que a tenra
idade de Jesus requeria, Simeão o toma em seus braços e eleva comovido a sua
oração: agora, Senhor, podes deixar teu servo ir em paz, segundo tua palavra:
porque meus olhos viram a tua salvação, a que preparastes ante a face de todos
os povos: luz para iluminar aos gentios e glória de teu povo Israel (Lc 2,
29-32). 

Ao final da sua prece, Simeão dirige-se especialmente a Maria, introduzindo naquele
ambiente de luz e alegria, um vislumbre de sombra. Continua falando da
Redenção, mas acrescenta que Jesus será sinal de contradição, a fim de que se
descubram os pensamentos de muitos corações, e diz à Virgem: uma espada
traspassará a tua alma (Lc 2, 34-35). É a primeira vez que alguém fala desse
modo. 

Até esse momento, tudo – o anúncio do Arcanjo Gabriel, as revelações a José, as
palavras inspiradas da sua prima Isabel e as dos pastores – tinha proclamado a
alegria pelo nascimento de Jesus, Salvador do mundo. Simeão profetiza que Maria
levará em sua vida o destino do seu povo, e ocupará um papel de primeira
grandeza na salvação. Ela acompanhará o seu Filho, colocando-se no centro da
contradição, em que os corações dos homens se manifestarão a favor ou contra
Jesus. 


Evidentemente, a Virgem Maria percebe que a profecia de Simeão não desmente,
mas completa tudo o que Deus lhe foi dando a conhecer anteriormente. A sua
atitude, nesse momento, será a mesma que as páginas do Evangelho sublinham em
outras ocasiões: Maria guardava todas estas coisas meditando-as no seu coração
(Lc 2, 19; cf. Lc 2, 51). A Virgem medita os acontecimentos; busca neles a vontade de
Deus, aprofunda nas inquietações que Yahvé põe em sua alma e não cai na
passividade perante o que acontece ao seu redor. Esse é o caminho, como
assinalava João Paulo II, para poder ser leais com o Senhor: «Maria foi fiel
antes de mais nada quando se pôs a buscar, com amor, o sentido profundo do
desígnio de Deus nela e para o mundo (…). Não haverá fidelidade se não
houver, na raiz, esta ardente, paciente e generosa busca; se não se encontrasse
no coração do homem uma pergunta, para a qual só Deus tem a resposta, melhor
dito, para a qual só Deus é a resposta» (João Paulo II, Homilia na Catedral
Metropolitana da Cidade do México, 26/01/1979). 

 Essa busca da vontade divina leva
Maria à acolhida, à aceitação do que descobre. Maria encontrará ao longo de
seus dias numerosas oportunidades para poder dizer «que se faça, estou pronta,
aceito» (ibid). Momentos cruciais para a fidelidade, nos quais provavelmente
advertiria que não era capaz de compreender a profundidade do desígnio de Deus,
nem como se levaria a termo; e no entanto, observando-os atenciosamente
aparecerá claramente o seu desejo de que se cumpra o querer divino. São
acontecimentos nos quais Maria aceita o mistério, encontrando-lhe um lugar na
sua alma «não com a resignação de alguém que capitula em frente a um enigma, a
um absurdo, senão com a disponibilidade de quem se abre para ser habitado por
algo por Alguém maior que o próprio coração.


Sob o olhar atento de Nossa Senhora, Jesus crescia em sabedoria, em idade e em
graça diante de Deus e dos homens (Lc 2, 52); quando chegaram os anos da vida
pública do Senhor, ia se dando conta de como se realizava a profecia de Simeão:
este será posto para ruína e ressurreição de muitos em Israel, e para sinal de
contradição (Lc 2, 34). Foram anos em que a fidelidade de Maria se expressou no
«viver de acordo com o que se crê. Ajustar a própria vida ao objeto da própria
adesão. Aceitar incompreensões, perseguições antes que permitir rupturas entre
o que se vive e o que se crê»; anos de manifestar de mil modos o seu amor e
lealdade a Jesus. Anos, enfim, de coerência: «o núcleo mais íntimo da fidelidade». Mas toda fidelidade –
como lhe é própria – «deve passar pela prova mais exigente: a da duração», isto
é, a da constância. «É fácil ser coerente por um dia ou por alguns dias.
Difícil e importante é ser coerente por toda a vida. É fácil ser coerente na
hora da exaltação, difícil ser na hora da tribulação. E só pode se chamar
fidelidade uma coerência que dura ao longo de toda a vida» (João Paulo II,
Homilia na Catedral Metropolitana da Cidade do México, 26/01/1979). 


Assim o fez Nossa Senhora: leal sempre, e mais ainda na hora da tribulação.
Encontra-se lá, no transe supremo da Cruz, acompanhada de um reduzido grupo de mulheres
e do Apóstolo João. A terra cobriu-se de trevas. Jesus, fincado no madeiro, com
uma imensa dor física e moral, lança ao céu uma oração que reúne sofrimento
pessoal e radical segurança no Pai: Eloí, Eloí, lemá sabacthaní? –que
significa: meu Deus, meu
Deus, por que me abandonastes?
 (Mc
15, 34). Assim começa o Salmo 22, que culmina em um ato de confiança:
lembrar-se-ão e converter-se-ão ao Senhor todos os confins da terra (Sl 22
(21), 28). 


Quais seriam os pensamentos de Nossa Mãe ao escutar o grito de seu Filho?
Durante anos tinha meditado no que o Senhor esperava dela. Agora, vendo o seu
Filho sobre a Cruz, abandonado por quase todos, Nossa Senhora teria presentes
as palavras de Simeão: uma espada traspassava as suas entranhas. Sofreria, de
modo singular, a injustiça que se estava consumando. E, no entanto, na
escuridão da Cruz, sua fé lhe poria diante dos olhos a realidade do Mistério:
estava se realizando o resgate de todos os homens, de cada homem. 

As palavras de Jesus, cheias de confiança, lhe fariam entender
com luzes novas que a sua própria aflição a associava mais intimamente à
Redenção. Do alto do patíbulo, no momento mesmo da sua morte, Jesus cruza o
olhar com o de sua Mãe. Encontra-a ao seu lado, em união de intenções e de
sacrifício. E assim, «o fiat de Maria na Anunciação encontra a sua plenitude no
fiat silencioso que repete ao pé da Cruz. Ser fiel é não trair, às escuras, o
que se aceitou em público» (João Paulo II, Homilia na Catedral Metropolitana da
Cidade do México, 26/01/1979). 


Com a sua diária correspondência, a Virgem tinha-se preparado para este
instante. Sabia que, com a sua entrega incondicional no dia da Anunciação,
também tinha abraçado, de algum modo, estes acontecimentos nos quais agora
participa com plena liberdade interior. «A sua dor forma um todo com a de seu
Filho. É uma dor cheia de fé e de amor. A Virgem Maria no Calvário participa da
força salvífica da dor de Cristo, unindo seu fiat, seu sim, ao de seu Filho»
(Bento XVI, Discurso do Angelus, 17/09/2006). Maria permanece fiel, e oferece a
seu Filho um bálsamo de ternura, de união, de fidelidade; um sim à vontade
divina (Via Sacra, IV estação). E sob a proteção dessa fidelidade, o Senhor
coloca São João e, com ele, a Igreja de todos os tempos: aí tens a tua mãe (Jo
19, 27). 

 J.J.Marcos


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É preciso perder o medo de errar

É preciso perder o medo de errar

O
humilde não tem medo de errar

Quem se reconhece e se aceita, quem é humilde,
não tem medo de errar. Por quê? Porque se, depois de ponderar, prudentemente, a
sua decisão, ainda cometer um erro, isso não o surpreenderá, pois sabe que é
próprio da sua condição limitada. São Francisco de Sales dizia de uma forma
muito expressiva: “Por que se surpreender que a miséria seja miserável?”.

Lembro-me ainda daquele dia em que subia a encosta da Perdizes, lá em São
Paulo, para dar a minha primeira aula na Faculdade Paulista de Direito, da PUC
(Pontifícia Universidade Católica). Ia virando e revirando as matérias,
repetindo conceitos e ideias. Estava nervoso; não sabia que impressão causariam
as minhas palavras naqueles alunos de rosto desconhecido. E se me fizessem
alguma pergunta a qual eu não saberia responder? E se, no meio da exposição, eu
esquecesse a sequência de ideias?

Entrei na sala de aula tenso, com um sorriso artificial. Comecei a falar. Estava excessivamente pendente do que dizia, nem olhava para a cara
dos alunos. Falei quarenta e cinco minutos seguidos sem interrupção, sem
consultar uma nota sequer.

Percebi, porém, um certo distanciamento da “turma”, um certo respeito. Um
rapaz, muito comunicativo e inteligente, talvez para superar a distância criada
entre o grupo e o professor, aproximou-se e me cumprimentou: “Parabéns,
professor. Que memória! Não consultou, em nenhum momento, os seus apontamentos.
Foi muito interessante!”

Respirei, mas, desconfiado,
quis saber: “Você entendeu o que eu disse?” Admirou-se com a minha
pergunta; não a esperava. Sorrindo, encabulado, confessou-me: “Entendi
muito pouco, e, pelo que pude observar, a ‘turma’ entendeu menos ainda”.

A lição estava clara: “Dei a aula para mim e não para
eles. Dei a aula para demonstrar que estava capacitado, mas não para ensinar”.
Faltara descontração, didática, empatia; não fizera nenhuma pausa, nenhuma
pergunta. Fora tudo academicamente perfeito, como um belo cadáver. Fora um
fracasso.

Lembro-me também que, quando descia aquela encosta, fiz o propósito de tentar
ser mais humilde, de preparar um esquema mais simples, de perder o medo de
errar, esse medo que me deixara tão tenso e tão cansado; de pensar mais nos
meus alunos e menos na imagem que eles pudessem fazer de mim. E se me fizessem
uma pergunta a qual não soubesse responder, o que diria? Pois bem, diria a
verdade, que precisava estudar a questão com mais calma e, na próxima aula,
lhes responderia. Tão simples assim.

Que tranquilidade a minha ao subir a encosta no dia seguinte! E que
agradecimento dos alunos ao verem a minha atitude mais solta, mais desinibida,
mais simpática! Uma lição que
tive de reaprender muitas vezes ao longo da minha vida de professor e de
sacerdote: a simplicidade, a transparência e a espontaneidade são o
melhor remédio para a tensão e a timidez e o recurso mais eficaz para que as
nossas palavras e os nossos desejos de fazer o bem tenham eco. 

Não olhemos as pupilas alheias como se fossem um espelho, no qual se reflete a
nossa própria imagem; não estejamos pendentes da resposta que esse espelho
possa dar às perguntas que a nossa vaidade formula continuamente: “O que é
que você pensa de mim? Gostou da colocação que fiz?” Tudo isso é
raquítico, decadente, cheira ao mofo do próprio “eu”, imobiliza e
retrai, inibe e tranca a espontaneidade. Percamos o medo de errar e erraremos
menos.


Dom Rafael Llano Cifuentes 
Arcebispo Emérito de Nova Friburgo (RJ)

 

Qual o valor das nossas escolhas?

 Qual o valor das nossas escolhas?

Elas
são responsáveis pelo brilho dos nossos olhos!
  “Um jovem aproximou-se de Jesus e lhe
perguntou: ‘Mestre, 
que devo fazer
de bom para ter a vida eterna?’
 Disse-lhe
Jesus: ‘Por que me perguntas a respeito do que se deve fazer de bom? Só
Deus é bom. Se queres entrar na vida, observa os mandamentos.’ ‘Quais?’,
perguntou ele. Jesus lhe respondeu: ‘não matarás, não cometerás adultério, não
furtarás, não dirás falso testemunho, honra teu pai e tua mãe, amarás teu
próximo como a ti mesmo’.
 Disse-lhe
o jovem: ‘tenho observado tudo isto desde a minha infância. Que me falta
ainda?’
 Respondeu Jesus: ‘se
queres ser perfeito, vai, vende teus bens, dá-os aos pobres e terás um
tesouro no céu. Depois, vem e segue-me!’


Ouvindo estas palavras, o jovem foi embora muito triste, porque possuía
muitos bens” (Mateus 19, 16-22)

“O valor das nossas escolhas e decisões são responsáveis pelo brilho dos
nossos olhos!” Fico imaginando sempre
o rosto desse jovem indo embora: um semblante triste., pois ele nunca
havia escutado nada igual como as palavras ditas por Jesus. O
jovem ficou desconcertado quando o colocaram em primeiro plano.
Muitos só tinham interesse no que ele possuia. Isso despertou nele o
quanto vale: “escolher e decidir”.

A escolha e a decisão dele foram contrárias à resposta de Jesus: O jovem colocou os bens materiais em primeiro plano. O
seu olhar já dizia isso! Penso que era um olhar sem brilho (como é triste ver
uma pessoa sem o brilho nos olhos!). Para
tudo o que acontece na nossa vida precisamos “escolher e decidir”. Ninguém
pode fazer isso por nós. Por isso a importância desse aprendizado. 

Um jovem tem uma vida pela frente, uma vida de oportunidades,
por isso é necessário que ele saiba fazer as suas escolhas e tomar
suas decisões. É como uma arte! Quero partilhar com você o que estou
aprendendo com isso: “O valor das nossas escolhas e decisões
são responsáveis pelo brilho dos nossos olhos!” Algumas delas pelo
brilho momentâneo e outras por aquele brilho perpetuado que se mantém por
décadas e gerações.

O brilho
momentâneo é aquele que reflete por alguns momentos a felicidade que nos é
fundamental, mas uma hora passa. O mais importante mesmo é o
brilho perpetuado, pois é aquele que continua em nossos olhos para
sempre. Vamos refletir:

Era evidente o brilho do meu olhar em várias situações: o primeiro beijo,
o meu primeiro tênis para jogar futebol, a primeira bicicleta com marcha,
meu primeiro emprego, a compra do meu primeiro carro (um fusca branco ano
78). Foram brilhos que marcaram a minha história, só que
foram brilhos rápidos. A vida é repleta
de brilhos
 e o
importante é saber aproveita-los hoje, agora, curtir cada um deles.
Se não fizermos isso, a vida vai passando e, um dia, olhamos para o
espelho e não enxergamos mais esse brilho dentro dos olhos.

O mais importante: o meu “brilho perpétuo” começou quando escolhi e decidi
seguir a proposta de vida eterna que Jesus Cristo me apresentou. Ele
continua nos meus olhos até hoje, pois é consequência das escolhas que fiz
lá atrás. Ninguém poderia ter feito isso por mim. Ninguém poderá
fazer por você. São duas moedas depositadas dentro de cada um. 

Precisamos resgatar esses valores. É possível viver assim
sem custo nenhum; ao contrário, é graça de Deus. Isso faz com que uma
explosão de alegria venha de dentro para fora. O mundo está precisando de
pessoas felizes, e não de pessoas “perfeitas”. Precisamos de pessoas com
brilho nos olhos mesmo com as dificuldades, com os problemas, crises e
defeitos. 

Sejamos luzeiros numa sociedade que está sem brilho nos olhos!

Acredite: tem jeito!

Cleto
Coelho

http://blog.cancaonova.com/temjeito